Programa de Observação de Estrelas Variáveis
Muitos astrônomos amadores não se contentam apenas em observar.Querem observar, coletar dados e contribuir de forma real à pesquisa astronômica. E um dos campos mais promissores na área da observação astronômica amadora é o da observação de estrelas variáveis. Mesmo com pequenos telescópios e binóculos, é possível observar diversas estrelas variáveis. Estrelas variáveis são estrelas que, com o tempo, variam de brilho, ou magnitude. Isso pode ser causado tanto por mudanças internas da estrela assim como por influência externa, como um eclipse entre as estrelas de um sistema binário. Independente da causa, a observação dessas variações é útil aos astrônomos profissionais para serem utilizadas em seus trabalhos científicos de pesquisa, principalmente no campo da astrofísica.Portanto, a observação de estrelas variáveis é considerada ideal para todo observador que tem algum tipo de instrumento, mesmo modesto. Outra vantagem é que a observação de estrelas variáveis pode ser feita mesmo a partir de centros urbanos, pois não se tratando de objetos difusos, como cometas, galáxias ou nebulosas, essas estrelas podem, ainda que com certa dificuldade, serem vistas de nosso próprio quintal, sem a necessidade do observador ter que se deslocar para locais mais escuros, longe das cidades.Nesta seção vamos apresentar as dicas básicas de como organizar um programa de observação de estrelas variáveis, o equipamento necessário, e as técnicas de observação.

…é um fato que, somente por meio da observação de estrelas variáveis,
o amador pode direcionar seu modesto equipamento ao uso prático, e,
mais ainda, em ampla escala, à busca do conhecimento em sua aplicação
à mais nobre das ciências.
—William Tyler Olcott, 1911
Fundador da AAVSO
Material Necessário
-Manual da AAVSO-Este manual, criado pela Associação Americana de Observadores de Estrelas Variáveis, é referência mundial para todo interessado em aprender a observar essas estrelas.É importante o observador estudar atentamente este manual antes de tentar observar.Baixe o manual em português aqui. Neste mesmo site existe uma ferramenta para a plotagem de cartas celestes, de modo que o observador pode gerar as suas próprias cartas de busca de estrelas variáveis.
-O Instituto Copernico situado na Argentina disponibiliza em seu site uma excelente lista de estrelas variáveis, divididas para observadores iniciantes e experientes.Vale ressaltar que nessa lista estão indicadas também as estrelas variáveis que são visíveis a olho nu.A partir dessa lista o observador pode selecionar as estrelas mais adequadas ao seu local de observação, e ao limite de magnitude de seu intrumento.Veja a lista aqui.
-Instrumentos:Mesmo a mais simples luneta pode servir para a observação de estrelas variáveis, respeitando é claro certos limites do próprio equipamento.Existem estrelas variáveis visíveis a olho nu, o que dispensaria o uso de qualquer instrumento.Mas com o uso de binóculos e telescópios, a quantidade de estrelas que podem ser observadas aumenta drasticamente.Muitas vezes o observador já tem um binóculos em casa, isso já abre um leque de diversas oportunidades.O ideal é o astrônomo amador ir gradativamente observando com instrumentos menores, lunetas ou binóculos, e mais tarde ampliar seu programa de observação com maior quantidade de estrelas, utilizando então um telescópio.Muitos destes detalhes estão muito bem explicados no Manual da AAVSO, portanto não vamos detalhá-los aqui.

Binóculo compacto, tipicamente 4 x 30, ou seja, com ampliação de 4 vezes e objetiva com 30 mm de diâmetro

Indicação no binóculo da sua potência(10x) e sua abertura em milímetros(50mm), com um campo de visão de 7 graus

Nesta fotomontagem apresentamos a Lua cheia junto à constelação do Cruzeiro do Sul, para propósito de comparação de escala angular. A Lua tem 30 minutos de arco de diâmetro, ou meio grau. Em comparação, do topo da “cruz” até a sua base temos 6 graus e 22 minutos de distância angular. Com o uso do binóculos 7 x50 mencionado no texto, poderia ser visualizada inteira a “cruz” do Cruzeiro do Sul, já que o campo do binóculos indica 7 graus.
A utilização do binóculo pelo iniciante é muito recomendada, pois o observador tem uma visão com “os dois olhos” e não com um só, como aconteceria se usasse um telescópio.Isso permite uma melhor visualização da área no céu onde se localiza a estrela variável, permitindo consequentemente uma avaliação mais precisa de sua magnitude.Os binóculos mais simples são os compactos, tipicamente marcados como “4 x 30”, ou seja, possuem uma ampliação de 4 vezes e uma abertura da objetiva de 30 milímetros.Mesmo com esse binóculo diminuto, é possível visualizar dezenas de estrelas variáveis.A segunda opção de binóculo é o chamado “7 x 50”, que é considerado o melhor para o estudo das variáveis, devido à sua combinação de aumento e abertura, que proporciona uma imagem nítida e luminosa dos campos estelares.Com esse binóculo, aumenta drasticamente a quantidade de estrelas variáveis disponíveis ao observador.
A opção seguinte ao observador no que se refere a instrumentos, depois dos binóculos, é a do uso de um telescópio, independente do seu tipo, seja ele refrator, refletor ou algo mais avançado.
Vale lembrar uma regra básica na observação de estrelas variáveis:nunca tente observar uma estrela que está além do limite de alcance de seu instrumento.Por exemplo, uma estrela variável que tem sem nível de variação, por exemplo, de magnitude 5(momento de seu maior brilho) até magnitude 11(momento de seu menor brilho) e se dispõe de um binóculo ou luneta cuja abertura diminuta não permita observar estrelas de magnitude superior a 10, fica evidente que a estrela variável em questão, no momento de seu menor brilho, não seria visível através desse instrumento.Portanto, dispondo de um telescópio de maior abertura permitirá a observação de estrelas variáveis cujo brilho esteja no mínimo com maior facilidade.Isso permite ao observador acompanhar a curva de luz completa da estrela, do máximo ao mínimo.Recordamos que a escala de magnitude estelar segue o padrão, sendo que quanto menor o número, maior é o brilho ou magnitude;quanto maior o número, menor é o brilho ou magnitude da estrela.Exemplo:uma estrela de magnitude 12 é muito mais difícil de observar do que uma estrela de magnitude 5.

Telescópio refletor Skywatcher de 150mm de abertura.Um telescópio como este permite ao observador ter acesso a centenas de estrelas variáveis
Mas que estrelas observar?
Há diversos “tipos” de estrelas variáveis.As estrelas que você vai eleger para observar vão depender de diversos fatores, que são os seguintes:
-Local de observação:dependendo de sua latitude muitas estrelas nunca serão visíveis para você, pois nunca nascem no horizonte.Cabe escolher estrelas que fiquem numa altitude melhor em relação ao horizonte local do observador, facilitando a observação.Basta consultar as estrelas escolhidas e por meio de um planisfério celeste ou software planetário, verificar qual é a altitude máxima da constelação vista a partir do local de observação.Se a constelação não fica muita alta sobre o horizonte mesmo em seu ponto máximo, isso dificulta a observação de estrelas ali localizadas.
-Instrumento:Dependendo do telescópio ou binóculo que eu possua, isso vai influir nas estrelas escolhidas.Se se dispõe de um binóculo pequeno, é de boa escolha observar as estrelas variáveis catalogadas como “visíveis a olho nu”.Mesmo assim, um pequeno binóculo vai permitir observar muitas outras estrelas, de brilho mais fraco.Se está disponível uma luneta, ou mesmo um telescópio refletor de maior abertura, o observador pode escolher estrelas cujo brilho mínimo esteja em níveis bem altos, como por exemplo, estrelas variáveis que ficam na magnitude 11 ou 12 na escala de variação.
-Um bom planisfério celeste é utilíssimo para o observador de estrelas variáveis.Na verdade é a primeira ferramenta a ser usada, pois permite saber se a constelação de interesse estará visível em certa data e hora.Segue o link de um planisfério celeste que pode ser usado no hemisfério Sul:
O planisfério celeste indicado no link acima deve ser impresso e montado. Recomendamos a impressão em papel cartão, para evitar deformações do papel. Outra excelente opção é plastificar as partes do planisfério, o que vai aumentar a sua durabilidade e resistência à umidade e desgaste. Este planisfério celeste é criação de Leuordsan Freires, que gentilmente o está disponibilizando-o gratuitamente para toda a comunidade astronômica amadora do Brasil. Com excelente qualidade gráfica, este planisfério é do tipo chamado “Dupla Face”, pois são dois mapas celestes, um mirando para o Norte e o outro para o Sul. Sendo dois mapas separados, a deformação das constelações é mínima, o que prejudicaria o seu reconhecimento no mapa. Planisférios mais simples possuem apenas um mapa, mas infelizmente tem uma acentuada deformação no desenho das constelações.

Quem possui um smartphone pode utilizar o programa astronômico Google Skymap, que proporciona uma orientação geral do céu e uma série de DSOs

No dia 18 de janeiro de 2014, os integrantes do GPAA , com o auxílio de cartas celestes de estrelas variáveis acessadas com um smartphone, puderam observar quatro estrelas variáveis na região de Orion.

Coragem! Cada passo em frente nos leva mais perto da meta, e, se não podemos
alcançá-la, podemos, pelo menos, trabalhar para que a posteridade não nos
censure por termos sido inertes, ou diga que nem ao menos fizemos um esforço
para suavizar o caminho para eles.
– Friedrich Argelander (1844)
O “pai” da astronomia de estrelas variáveis
- As estrelas variáveis podem se dividir na seguinte tabela:
O General Catalogue of Variable Stars classifica as estrelas variáveis em seis classes distintas, de acordo com as razões causadoras da variabilidade observada:
- variáveis eruptivas
- variáveis pulsantes
- variáveis rotacionais
- variáveis cataclísmicas, explosivas, ou do tipo-Nova
- sistemas binários eclipsantes
- sistemas binários com fontes intensas de raios-X
Variáveis eruptivas
A luminosidade dessas estrelas é causada por erupções e outros processos violentos que ocorrem em suas cromosferas e coronas. As mudanças na luminosidade são frequentemente acompanhadas pela ejeção de matéria na forma de vento estelar de intensidade variável e/ou por interação com a matéria do meio interestelar circundante. São tipos de estrelas eruptivas U Geminorum , estrelas de rápidas erupções, podendo aumentar sua luminosidade em 5 magnitudes durante uma noite e o tipo R Coronae Borealis que possui diminuição de luminosidades súbita e irregulares, são ricas em carbono e pobres em hidrogênio.
Variáveis pulsantes
Nessas estrelas a variabilidade decorre da expansão e contração de suas camadas superficiais. As pulsações podem ser radiais ou não radiais. As pulsações modulam a luminosidade da estrela, causando variações periódicas ou semi-periódicas em escalas de tempo que podem variar de alguns minutos ou horas até algumas dezenas de anos ou séculos.
Variáveis rotacionais
São estrelas com uma distribuição superficial de brilho não-uniforme ou com formato elipsoidal. A variabilidade é então causada pela rotação axial da estrela em relação ao observador. A distribuição não-uniforme do brilho pode ser causada pela presença de manchas ou por qualquer outra desuniformidade térmica ou química na atmosfera da estrela, produzida pelo campo magnético cujo eixo de simetria, normalmente, não coincide com o eixo de rotação da estrela.
Variáveis cataclísmicas, explosivas e do tipo-Nova
Nas variáveis explosivas, as explosões são causadas por processos termonucleares em suas camadas superficiais (Novas), ou pelo colapso de seus núcleos (Supernovas). As estrelas desta classe mostram uma rápida liberação de energia para o espaço circundante.Em uma variável cataclísmica é muito comum se observar sistemas em que uma das componentes é uma estrela anã branca quente rodeada por um disco de acreção formado por matéria proveniente de sua companheira, uma estrela com volume maior e mais fria. As variações de até 5 magnitudes ocorrem em alguns sistemas, conhecidos como novas anãs e são devidas a queda abrupta do material do disco no potencial gravitacional da anã branca causada por instabilidades do disco quando este se encontra muito denso. Variáveis cataclísmicas dão a origem às novas.
Sistemas binários eclipsantes
Nesta classe a causa da variabilidade é extrínseca à estrela, sendo decorrente de eclipses. Os eclipses ocorrem quando o plano orbital do sistema binário está aproximadamente alinhado com a linha de visada do observador, de forma que o observador pode ver quando uma das estrelas transita em frente da outra, obstruindo total ou parcialmente a passagem de sua luz. Durante o eclipse, a intensidade da luz do par binário sofre uma variação, cuja magnitude depende da relação das luminosidades das duas estrelas. Nesta classe de estrelas variáveis, a variabilidade é periódica e o período dos eclipses é igual ao período orbital.
Fontes variáveis de raios x
Existem sistemas binários que são fontes variáveis de raios X, as quais não podem ser classificadas em nenhuma das classes precedentes. Uma das componentes do sistema é um objeto compacto e quente, como uma anã branca, uma estrela de nêutrons, ou, possivelmente, um buraco negro, e recebe uma injeção de matéria vinda da companheira ou de um disco de acreção. O fluxo de matéria é o que dá origiem à emissão de raios X, a qual atinge a atmosfera da companheira que, sendo mais fria do o objeto compacto, re-irradia, na forma de radiação térmica de alta temperatura (efeito de reflexão). Este efeito é responsável pelas características complexas da variabilidade óptica observada neste tipo de sistema binário.
Um tipo muito recomendado de estrela variável para o observador é o tipo Mira.Elas são adequadas pois tem um período de variação mais longo, de modo a que suas mudanças de brilho são mais suaves, permitindo o observador coletar uma grande sequência de observações, para construir uma curva de luz.Outras estrelas, de período mais curto, exigem uma vigilância quase diária, o que torna a observação mais difícil de ser realizada.
Variáveis Mira são estrelas variáveis de Longo Período – ou LPVs -, estrelas gigantes vermelhas, normalmente de tipo espectral M, que apresentam oscilações de brilho em torno de seis magnitudes entre o máximo e o mínimo brilho. O período destas variáveis – definido como o intervalo entre dois máximos consecutivos – é em média de um ano aproximadamente. Esses valores podem variar entre diferentes LPVs ou mesmo em diferentes ciclos de uma mesma estrela. Exemplos: Mira Ceti, R Carinae, R Leonis, Chi Cygni, R Hydrae e R Centauri.
Para quem já tem alguma experiência na observação de estrelas variáveis e quer se aprofundar, pesquisando por outras estrelas, recomendamos acessar o site do Instituto Astronômico Sternberg, situado na Rússia. Neste site é possível pesquisar o seu enorme banco de dados de estrelas variáveis. Acesse o site aqui.
Mais detalhes sobre as variações de brilho das estrelas variáveis, curvas de luz, técnicas de avaliação de magnitude, consulte o Manual da AAVSO, onde estão detalhadas essas informações.
Prosseguindo com as observações de estrelas variáveis, os integrantes do GPAA observaram com sucesso a estrela binária eclipsante Beta Lyrae. Os dados da observação foram imediatamente enviados à AAVSO, na mesma noite da observação. O GPAA está selecionando estrelas variáveis mais brilhantes, devido à intensa poluição luminosa na cidade de Ponta Grossa, o que tem atrapalhado bastante as observações.

Concepção artística do sistema Beta Lyrae. Uma das estrelas “perde” matéria para a estrela vizinha, criando um disco de acreção.
Um dos integrantes do GPAA, Marcelo Kaczmarech colabora com a AAVSO- Associação Americana de Observadores de Estrelas Variáveis com suas observações de diversas estrelas.

Em 2013 o telescópio espacial Hubble obteve uma série de fotos da estrela variável RS Puppis, com as quais foi feito um vídeo “Time Lapse” da variação de brilho da estrela.
Com a rápida difusão dos celulares, com uma infinidade de modelos e recursos, como visualizadores de fotos, gravador de voz, filmadora, câmera fotográfica, internet, entre outros, ficou evidente que um aparelho desses teria muita utilidade para o astrônomo amador em campo. O GPAA testou um celular, com aplicativos instalados com o objetivo do observador não precisar dispor em campo de planisfério celeste e cartas de busca, de modo que toda a informação necessária agora é obtida rapidamente, e em um dispositivo que cabe no bolso. Muitas vezes, principalmente quando o observador está sozinho, é difícil manipular as cartas celestes, planisfério, e ainda cuidar do binóculos, entre outras coisas. Com o uso do planisfério eletrônico e as cartas de busca, todas instaladas no celular, o observador agiliza o seu trabalho de observação, e leva menos material em campo.

Celular LG C300, com uma tela lcd maior, facilita a visualização do planisfério eletrônico MobileStarChart
Em 28 de julho de 2013 o GPAA recebeu um email do diretor da AAVSO informando que os dados coletados pelos integrantes do GPAA sobre estrelas variáveis, no caso Alpha Orion, também conhecida como Betelgeuse, foram solicitados por um astrônomo profissional para análise e uso em modelos de evolução estelar. Segue abaixo o email recebido da AAVSO:
Data Usage Report: Weekly summary of data downloads from the AAVSO Your AAVSO observercode: KMY Your observations were included in the following data downloads during the past seven (7) days: Date Star name # obs. User Purpose --------------------------------------------------------------------------- 2013-07-22 ALF ORI 3 Pro Analysis --------------------------------------------------------------------------- Data Usage Report is a service for the observers of the AAVSO to provide information on how your observations are being used.
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